detalhe de foto de José António Barão Querido, alçada da tapada

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O mundo em mutação, a Europa em crise – e Portugal?

March 1, 2007
Faculdade de Economia do Porto
“O mundo em mutação, a Europa em crise – e Portugal?”
Conferência-debate
Jorge Sampaio
Porto, 1 de Março de 2007

 


Senhores Professores

Caros estudantes

Meus amigos

  • Antes de mais, deixem-me dizer-lhes que foi com todo o gosto que aceitei o convite para participar nesta conferência-debate, organizada pela Associação de Estudantes da Faculdade de Economia do Porto.
  • Congratulo-me ainda com o facto desta intervenção ter sido incluída no ciclo de conferências que a Faculdade vem organizando, com o objectivo de abrir perspectivas de discussão aos seus alunos como complemento das actividades lectivas correntes.
  • Sempre achei muito estimulante este tipo de encontros com jovens, não só pela energia e optimismo que em geral conseguem transmitir, mas também porque os seus pontos de vista acrescentam sempre algo à visão de um político insatisfeito e mesmo um pouco inconformado como eu sou.
  •  Por isso, durante os últimos dez anos nunca deixei de dedicar um tempo considerável – quer no país, quer aquando de deslocações ao estrangeiro – a debates com estudantes, a visitas a escolas, politécnicos e universidades, ao diálogo franco e aberto com todos quer sobre questões de educação e de formação, quer sobre temas de sociedade mais vastos, ligados à actualidade e às preocupações que o futuro suscita;
  •  Entendo que nestes intercâmbios todos temos a ganhar e que, quanto mais cimentarmos a solidariedade inter-geracional, maior será a nossa capacidade de apreendermos o presente e de formularmos projectos mobilizadores;
  •  De facto, neste tempo de mudanças tão velozes, incertas e imprevisíveis – até por efeito da própria globalização – é preciso saber manter sobre a vida um olhar desperto, desenvolver a capacidade de adaptação, enfrentar os problemas com a lucidez possível e encarar as injustiças emergentes com o necessário sentido crítico.
  •  Neste mundo crescentemente interdependente, segundo lógicas frequentemente desiguais, a acumulação de conhecimentos, a aquisição de competências técnicas e a especialização são, sem dúvida, necessárias, mesmo indispensáveis, mas já não habilitam nem garantem uma vida profissional – para já não falar no plano pessoal – bem sucedida.
  •  E o que dizer de todos aqueles que, tantas vezes por razões que os ultrapassam, não chegam sequer a adquirir competências básicas?
  •  Por todas estas razões, achei interessante subordinar as reflexões que venho partilhar convosco ao título “O mundo em mutação, a Europa em crise – e Portugal ?”
  •  É um tema muito vasto, controverso e sobretudo em aberto, por isso gostaria de sublinhar a interrogação que lhe está subjacente.
  •  Mais do que teorias e certezas quero partilhar convosco interrogações, porventura algumas preocupações e sobretudo proporcionar-vos “matéria para pensamento”, socorrendo-me da curiosa expressão dos anglófonos – food for thought, – mas que traduzida em português não tem a mesma força expressiva!
  •  Percorramos pois sucessivamente estes 3 horizontes do universo espacio-temporal em que vivemos – o mundo, a Europa e, naturalmente, Portugal

 

Primeiro horizonte

Um mundo em mutação 

 

  • Tornou-se quase banal afirmar que a história se acelerou nas últimas décadas e que a globalização precipitou um conjunto de profundas mudanças.
  •  Mas, no plano económico, serão as mudanças em curso realmente um resultado directo da globalização ? Ou decorrerão elas afinal da evolução do próprio processo de industrialização e da incapacidade dos agentes económicos e do Estado para formularem a tempo estratégias de contenção de riscos e de reconversão do padrão de especialização das economias  ?
  •  É bom não esquecer que ao longo da história as economias evoluíram continuamente e hoje atravessamos uma fase de mutação em direcção a uma economia de serviços, que, de resto, vai – pelo menos em parte – ao encontro das novas  necessidades da população.
  •  Pessoalmente, inclino-me a pensar que muitas destas mudanças teriam lugar com ou sem globalização, embora porventura a um ritmo completamente diferente.
  • De facto, a globalização acelerou todo este processo através dos efeitos resultantes da aceleração dos fluxos de capitais, das inovações tecnológicas e da redução dos preços de importação.
  • Mas não me parece valer a pena aprofundar esta questão, que é um pouco como a da galinha e o do ovo.
  • A meu ver, o que importa mesmo é sublinhar, por um lado, o papel das novas tecnologias da informação e da comunicação – as TIC que vocês tão bem conhecem – como vector de profunda mudança da vida económica no sentido da progressiva integração dos mercados à escala mundial. Por outro, o conjunto de alterações sociais, políticas e culturais que igualmente se produziram e que criaram um novo modelo de sociedade – aliás chamado “sociedade da informação”;
  • Neste conjunto de mutações, se a  economia de mercado e a democracia parecem ter sido erigidas em princípios amplamente aceites, em contrapartida, também parece claro que os mercados não podem resolver todos os problemas, nem asseguram – longe disso – uma partilha equitativa dos benefícios decorrentes da sua eficácia específica.
  • Mas vejamos: afinal o que mudou com a globalização ?
  • Em termos muito sintéticos, poderíamos dizer: a globalização trouxe um ritmo de crescimento económico ímpar, mas produziu também um colossal aumento das desigualdades. São estas as duas faces da moeda “globalização”.
  • De facto, aumentou o fosso entre os países ricos e pobres, bem como dentro de cada um deles, entre os segmentos mais favorecidos e os mais carenciados. O quarto da população mundial mais rica viu o seu rendimento aumentar seis vezes durante o século XX, ao passo que o rendimento do quarto mais pobre apenas triplicou.
  • Esta realidade profundamente contrastada mostra que a resposta à globalização também não foi uniforme, longe disso. Por isso há aqui duas questões interessantes a levantar:

 

 

  •  
    • Uma diz respeito à forma como os países em desenvolvimento enfrentaram o desafio da globalização e da integração dos mercados;
    • A outra refere-se à forma como os países industrializados responderam a este mesmo desafio.

 

 

  • Quanto ao primeiro grupo, devemos antes de mais reconhecer a  profunda heterogeneidade no modo como reagiram às oportunidades da globalização. Em alguns países – especialmente na Ásia – encetou-se desde 1970 um movimento de aproximação dos rendimentos per capita dos países industriais. Noutros – aliás um grupo numeroso – os progressos têm sido  lentos e, por vezes, tem mesmo havido retrocessos. Particularmente em África, o rendimento per capita recuou em relação às regiões industrializadas e em alguns países declinou mesmo em termos absolutos.
  • Mas para melhor tentar avaliar o sentido e a qualidade do crescimento, para além do rendimento per capita, podemos e devemos utilizar também outros indicadores.
  • Por exemplo, se usarmos o chamado Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) – que, como sabem, considera outras dimensões, como a educação, a esperança de vida etc -,  podemos obter uma imagem mais completa e realista dos contrastes entre as condições de vida das populações.
  • Deve, no entanto, sublinhar-se que mesmo se, numa perspectiva a longo prazo, o “fosso IDH” diminuiu, há ainda muitos milhões de pessoas a perder terreno. Pode ter aumentado a esperança de vida (o que nem sempre acontece, designadamente em África por causa da SIDA), mas a qualidade de vida não melhorou, a pobreza absoluta persiste. Há 19% da população mundial a viver com menos de 1 dólar por dia.
  • Pegando agora na segunda questão que acima coloquei – qual a perspectiva dos países avançados em relação à globalização – poderia formulá-la de outra maneira: será que esta tem prejudicado os interesses dos populações e em particular dos trabalhadores ?
  • Não restam dúvidas que a globalização tem criado novas vulnerabilidades em vastos sectores sociais dos próprios países avançados, designadamente da União Europeia.
  • O aumento da concorrência e as deslocalizações, entre outros factos, têm produzido um impacto negativo no tecido produtivo, na qualidade do emprego e do trabalho e nos níveis de desemprego de muitos desses países.
  • Agora a questão política fundamental que se levanta é a da repartição dos ganhos pois estes não se distribuem de forma equitativa entre as categorias sócio-profissionais, havendo mesmo uma clara deterioração da situação de certos grupos. É o caso, por exemplo, dos trabalhadores de algumas indústrias transformadoras (têxteis, calçado etc) que experimentam sérias – senão intransponíveis – dificuldades para fazer a transição para um padrão industrial bem mais qualificado.
  • Em suma, devemos concluir que, quer se goste, quer não, a globalização da economia é uma realidade concreta, incontornável e imparável.
  • Portanto, a questão relevante não é ser a favor ou contra, mas sim saber que globalização  queremos e como a poderemos gerir para a melhorar  em benefício de todos.
  • As forças de mercado são um eficiente e eficaz mecanismo de afectação de recursos e de crescimento económico, mas entregues a si próprias, por vezes, limitam ou condicionam de forma indesejada a vida e até a cultura das pessoas, do mesmo modo que as exigência dos mercados financeiros internacionais e a luta pela competitividade também podem originar tensões e conflitos entre países.
  • Porém, a solução não está em menos globalização e mais proteccionismo, mas sim em mais e, sobretudo, melhor globalização.
  • Um dos desafios da globalização para os países desenvolvidos é precisamente gerirem as mudanças económicas e sociais que a mesma implica, nomeadamente em termos de alteração na divisão internacional do trabalho e na distribuição do rendimento, sem se renderem ao proteccionismo. 
  • Por conseguinte, há que insistir na necessidade de uma estratégia política de resposta aos desafios da globalização e às mutações por ela operada.
  • É aqui que se torna claro que os mercados não substituem a política, antes a tornam mais necessária.
  • É aqui que se vê também que os movimentos de integração política regional são indispensáveis para que as respostas políticas tenham uma escala suficiente para serem eficazes e poderem assegurar a regulação.
  • No que a Portugal diz respeito, parece-me óbvio que só uma resposta a nível europeu permitirá enquadrar de uma forma sólida as abordagem nacional e assim responder cabalmente aos desafios globais.
  •  Sobre o modo de responder politicamente a estes desafios, as opiniões divergem e tem-se assistido a algumas hesitações um pouco por todo o lado.
  • Deverão os países tentar proteger grupos específicos de trabalhadores – como por exemplo, os trabalhadores com salários baixos de indústrias em declínio ? Deverão ser impostas restrições aos fluxos comerciais e de capitais ?
  • No curto prazo, esta abordagem poderá porventura ajudar, mas em última instância e no longo prazo será feita em detrimento dos padrões de vida da população em geral.
  • Ao contrário, parece-me que o mais adequado será apostar, por um lado, na integração na economia global (e nesta medida a Agenda de Lisboa, embora com algumas claras insuficiências, aponta para o bom caminho); por outro, em medidas sociais de prevenção e de acompanhamento e, neste plano, falta ainda uma Agenda Social europeia à altura dos desafios.
  • A economia europeia como um todo será sempre mais próspera e igualitária, se forem seguidas políticas não apenas sintonizadas com a promoção de uma economia aberta, mas também com a preocupação social de contenção das vulnerabilidades e de uma partilha mais equitativa dos benefícios.
  • Não há fatalismos.
  • Há que quebrar o mito dos neo-liberais de que a lógica dos mercados resolve todos os problemas e esvazia o campo de actuação política.
  • Há igualmente que quebrar o mito de que a globalização é ingovernável e que anula o espaço de intervenção pública.
  • Por isso, a questão dos direitos económicos, sociais e culturais adquire a esta luz uma dimensão tão importante.
  •  Para que a globalização seja promessa de um futuro melhor para todos – quer para os trabalhadores pobres do mundo desenvolvido quer para os trabalhadores paupérrimos do mundo em desenvolvimento –, a Comunidade Internacional deverá empenhar-se em reforçar a sua capacidade de intervenção e em desempenhar um papel mais activo enquanto instância de regulação política no quadro da mundialização da economia e das relações sociais.
  • Por isso, para além de uma agenda nacional, é indispensável uma Europa forte com uma voz activa na cena mundial, tanto mais autorizada quanto for capaz de fundar a sua política externa no respeito pelos Direitos Humanos, nos valores da solidariedade internacional e na defesa do multilateralismo. Neste aspecto, a Europa tem desempenhado um papel importante enquanto parceiro incontornável do desenvolvimento sustentável das regiões do mundo mais desfavorecidas. Mas poderia claramente fazer mais e melhor.

 

 

Segundo horizonte

A Europa em crise

 

  • Há vinte anos atrás, quando Portugal e Espanha aderiram à então Comunidade Europeia (1986), esta atravessava um dos períodos mais dinâmicos de toda a sua história.
  • Por isso, há quem caracterize a década de oitenta como a da Europa galopante (F. Gonzalez, em Yuste, Julho 2006).
  • Década de sucessos europeus, de facto, caracterizada :
    • pelo alargamento a sul
    • pela adopção do Acto Único e, mais tarde, do Tratado de Maastricht
    • pela plena realização do Mercado Interno e da União Económica e Monetária, dois marcos chave do processo de integração europeia.
  • Por seu turno, a alteração profunda do contexto internacional (com a queda do muro de Berlim, a unificação alemã e o fim da guerra fria) em vez de dividir a Europa, veio consolidá-la.
  • E porquê ?
  • Porque a União Europeia soube responder com uma adequada estratégia a estes novos e inesperados desafios.
  • Inspirando-me agora na metáfora da Europa galopante, poderia dizer que se lhe seguiu a fase da posta-restante, a qual corresponde sensivelmente à nossa segunda década de integração europeia (1996-2006).
  • É verdade que, em 2004, a União Europeia dobrou o cabo do alargamento a leste, que representou um marco histórico no mapa da reunificação do continente e um tempo forte da construção europeia.
  • Mas os resultados destes anos de transição de século não têm respondido às altas expectativas depositadas no projecto europeu, num contexto internacional sempre mais volátil e preocupante
  • De facto, a União Europeia ainda não conseguiu abrir caminho para um novo patamar de integração que lhe permita enfrentar os desafios e ameaças presentes.
  • Entre o cisma iraquiano (que causou inúmeras e duradouras sequelas) e a recusa do Tratado Constitucional em França e nos Países Baixos com as conhecidas e actuais repercussões, parece existir uma inquietante linha de continuidade, corroborada por uma extensa sequência de dificuldades que se vêm avolumando.
  • Penso, por exemplo, no plano da segurança, no do emprego e no da economia. Mas penso, também, na questão das fronteiras da Europa, do diálogo de culturas e civilizações, da imigração ou da própria identidade europeia.
  • Neste conspecto do tempo europeu, 2005 e 2006 assemelharam-se, de facto, a anos de ressaca para a Europa com contornos de verdadeira crise.
  • Ressaca porque a digestão do êxito do alargamento não se revelou fácil e não surtiu os efeitos esperados.
  • Ressaca também por causa do impasse constitucional europeu.
  • Crise, por último, porque há uma real acumulação de dificuldades internas e de inúmeros factores de perturbação externa.
  • Isto faz com que estejamos perante uma verdadeira crise de confiança no projecto europeu.
  • De facto, no inconsciente colectivo dos europeus, por um lado, o ónus de todas as presentes dificuldades recai indistintamente sobre “Bruxelas”, e, por outro, a “Europa” parece canalizar todos os receios, ameaças e incertezas de que os cidadãos se sentem rodeados.
  • Mas, na realidade, devemos reconhecer que é precisamente nas áreas em que os efeitos controversos da globalização mais se têm feito sentir – economia, emprego, segurança, imigração – que a Europa menos se tem revelado capaz de secundar a acção dos Estados na sua resolução.
  • Persiste a dificuldade central em encontrar respostas adequadas para os incessantes desafios da globalização, embora a Comissão venha fazendo esforços crescentes no sentido de relançar algumas políticas europeias e de assim reforçar as solidariedades de facto entre os parceiros europeus em torno do projecto europeu.
  • No meu entendimento, estas dificuldades com que nos defrontamos, reflectem, pela sua dimensão estrutural, preocupantes sinais de vulnerabilidade do modelo de desenvolvimento comum à maioria dos parceiros da União Europeia.
  • Ora, para estes problemas, que são de natureza global, não há, parece-me, soluções unilaterais nem espaço para atitudes isoladas.
  • Por isso, o primeiro passo neste processo consiste em recusar os impasses do proteccionismo, do retraimento internacional e do impulso libertário de desmantelamento do modelo social europeu.
  • Importa, depois, empenharmo-nos na procura das melhores estratégias para que a União Europeia, como um todo, possa sair da crise.
  • Não tenho, por mim, quaisquer dúvidas de que a solução dos actuais problemas só será possível com mais Europa.
  • Quando digo mais Europa, penso numa União Europeia mais integrada politicamente, no sentido para que aponta o Tratado Constitucional europeu.
  • Por isso entendo que, qualquer que seja a solução formal a encontrar, importa preservar o acervo do actual Tratado.
  • Os avanços que contém permitirão dar um impulso político à União. Poder-se-ia naturalmente ter ido mais longe. No plano social ou ainda institucional.
  • Mas importa não desperdiçar as potencialidades que este Tratado encerra.
  • Devemos evitar que o seu património seja liquidado, saldado ou posto em leilão, o que só prejudicará países de dimensão média, como Portugal. Há que lutar pela sua recuperação.
  • Só com mais Europa política poderemos evitar o declínio e a irrelevância para que algumas teses em voga nos pretendem remeter.
  • A União Europeia é demasiado importante no sistema internacional para se entregar a uma lógica de fechamento depressivo ou a reacções emocionais face aos poderes que lhe disputam espaço de influência no mundo de hoje, representem eles hegemonias já instaladas, como a americana, ou potências emergentes como a China ou a Índia.
  • É indispensável acelerar a reforma económica na linha definida pela agenda de Lisboa e, por outro, aplicar programas eficazes de justiça social.
  • Nos países de economia emergente, o grande desafio que se coloca é justamente o da construção de sociedade integradas e inclusivas o que, a meu ver, passa pela construção de sistemas de protecção social (welfare systems).
  • Neste particular, sem dúvida que o essencial será preservar o modelo social europeu combinando com uma economia do conhecimento dinâmica, competitiva e eficaz.

 

 

Terceiro horizonte

E agora nós ?

 

  • Ao virar a página de duas décadas de integração europeia, devemo-nos interrogar – e agora?
  • O que podemos esperar da Europa, o que podemos fazer por Portugal?
  • Os tempos têm sido difíceis.
  • Instalou-se um certo negativismo. Onde antes havia certezas, hoje há interrogações e dúvidas.
  • A confiança dos portugueses no projecto europeu entrou em declínio, segundo as indicações do Eurobarómetro.
  • Deixámos de pertencer a alguns núcleos avançados da integração europeia – não ratificámos o Tratado Constitucional, não fazemos parte dos grupos pioneiros em matéria de Justiça e Assuntos Internos, até deixámos de ser apontados como os bons alunos da União Europeia.
  • Mas não nos devemos deixar abater. Há que reforçar a nossa vontade de agir com continuidade e persistência. Muito depende de nós. Somos capazes de fazer mais e melhor. O que temos de fazer?
  • A meu ver, estaremos a contribuir para o avanço da Europa, se, antes de mais, soubermos responder aos desafios internos que se colocam ao nosso país, os quais se inscrevem, de resto, na Europa que foi e é opção e projecto de futuro.
  • Já por diversas vezes os enumerei. Não vou aqui detalhá-los, se quiserem poderão ficar para o debate. Mas só para exemplificar, refiro-me:
    • ao desafio da educação para garantir uma escolaridade básica de qualidade para todos e a erradicação dos actuais níveis de iliteracia ;
    • ao desafio da formação profissional e da educação ao longo da vida para ultrapassar o elevado défice de qualificação dos nossos activos;
    • ao desafio da investigação e da inovação tecnológica com vista a uma maior interactividade entre o mundo empresarial e científico;
    • ao desafio da competitividade e do crescimento económico para estimular uma ligação descomplexada entre a iniciativa empresarial e o Estado;
    • ao desafio da coesão social e em particular territorial para corrigir assimetrias de rendimento que nos afastam dos padrões europeus e atenuar as desigualdades territoriais que continuam a fazer de Portugal um país profundamente dual;
    • ao desafio do que chamaria, por fim, da requalificação da democracia para aí incluir a credibilização da justiça, a transparência da vida político-partidária, a estabilização de um núcleo duro de direitos, a reabilitação do sentido do exercício da cidadania  etc
  • Todos estes desafios convergem afinal para um aperfeiçoamento constante da democracia e da sua arquitectura institucional que é o Estado de Direito, arquitectura que perderá sentido útil sempre que se dissociar dos cidadãos, da sua energia cívica e de uma genuína vontade de participação.
  • Em todas estas áreas, que constituem uma espécie de agenda de Objectivos de Desenvolvimento do Milénio para Portugal, ganharíamos porventura em fixar metas concretas e realistas, a cumprir dentro de prazos antecipadamente estabelecidos.
  • Parece-me que só assim poderemos vencer uma espécie de inércia, imobilismo e conservadorismo, tão arreigados na nossa forma de ser, que nos tem impedido de avançar com as indispensáveis reformas que nos permitirão acertar o passo com a Europa.
  • Até porque reformando Portugal, serviremos a causa europeia e daremos razão a uma visão forte da Europa.
  • Gostaria de terminar referindo-me brevemente aos desafios externos de Portugal, não só porque estes constituem um aspecto menos tratado, mas também porque a dimensão externa e internacional é hoje condição de sobrevivência de um país.
  • E, neste plano, mencione-se de novo e em primeiro lugar a Europa uma vez que é no quadro europeu que se joga o essencial da  nossa autonomia de decisão e da nossa afirmação externa, designadamente nas nossas áreas prioritárias de relacionamento.
  • Neste âmbito, é também oportuno salientar o elevado nível de participação que Portugal tem assegurado no seio das forças internacionais de paz da ONU, da NATO e da EU, assim como o desempenho exemplar dos militares portugueses nessas missões.
  • Este é um ponto que deve ser destacado porque é uma das frentes do projecto europeu em que Portugal tem estado sempre presente, na primeira linha.
  • A este propósito, permitam-me que evoque ainda o exercício por Portugal da Presidência da União Europeia, no segundo semestre deste ano, a qual constituirá uma ocasião privilegiada para reafirmar o nosso firme empenho europeu e para contribuirmos para o avanço da integração europeia, com determinação, visão e estratégia.
  • Gostaria a este propósito de vos lançar um apelo para que acompanharem com atenção o desenvolvimento dos trabalhos da Presidência Portuguesa e para que, além disso, não se inibam de participar activamente no debate público das questões políticas, económicas e sociais que decorreram da agenda europeia do segundo semestre.
  • É importante que esta Presidência seja vivida como um exercício colectivo em que seja visível a participação e o empenho dos cidadãos, especialmente dos jovens porque afinal, é vossa.
  • Ainda uma sugestão, ou se quiserem, um desafio que aqui vos deixo: preocupa-me actualmente a questão do que representa afinal a Europa para os nossos jovens de hoje, da forma como a vêem, do modo como articulam o vosso futuro no quadro europeu.
  • Para as pessoas da minha geração, a Europa representava um núcleo de valores fundamentais – a paz, antes de mais; a democracia e a liberdade; a prosperidade, naturalmente.
  • Mas não estou hoje seguro de que a vossa percepção seja a mesma. Este hiato interessa-me no contexto das minhas reflexões sobre o projecto europeu.
  •  Se quiserem participar neste exercício, enviem-me os vosso comentários e observações, que me serão, estou seguro, da maior utilidade, para o meu mail [www. casado regalo.pt] – como vêem também eu me converti às TIC…! Não deixarei depois de lhes dar feed-back! Aqui fica esta proposta de um pacto de colaboração!

 

 

Meus amigos 

 

  • É bom não esquecer que a afirmação de um país não se mede só em função da dimensão do território ou do PIB, mas da sua capacidade de se afirmar como parceiro credível, empenhado em contribuir efectivamente e activamente para a resolução dos problemas e para o desenvolvimento de políticas cooperativas e inovadoras.
  • Por exemplo, é essencial também que saibamos defender a língua portuguesa, não só porque é das mais faladas do mundo, como também pelo facto de ser uma língua de negócios e de cultura presente em todos os continentes, que representa um poderoso instrumento de política externa e de diplomacia económica e cultural, embora ainda amplamente inexplorado.
  • Para a afirmação externa de Portugal e dos nossos interesses, é fundamental envidar todos os esforços para nos mantermos no “pelotão da frente” e melhorar a nossa imagem.
  • É preciso que o nome de Portugal acrescente valor, evoque capacidade de diálogo e sentido solidário, sobretudo para com os países menos desenvolvidos, um nome que possa ser associado a qualidade e modernidade, mas também a atitude cooperativa e a participação empenhada na resolução multilateral dos grandes problemas mundiais,
  • Tal estratégia não pode resumir-se contudo a uma operação de marketing para o exterior.
  • É um processo mais fundo, que os próprios portugueses devem assumir, desde logo transformando a visão pouco positiva que muitas vezes têm de si próprios.
  • Através de uma atitude mais afirmativa, empreendedora e que não receie ser inovadora, temos, creio eu, boas razões  para acreditar no futuro.
  • Espero que partilhem este meu ponto de vista.

 

 

Muito obrigado a todos