detalhe de foto de José António Barão Querido, alçada da tapada

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PORTUGAL E OS DESAFIOS DA ERA GLOBAL – CASA MUSEU JOÃO SOARES

November 21, 2006

CONFERÊNCIA

  

PELO DR. JORGE SAMPAIO,

 

NA CASA MUSEU JOÃO SOARES

 

 

PORTUGAL E OS DESAFIOS DA ERA GLOBAL –

ALGUMAS REFLEXÕES PESSOAIS

  

 

Casa Museu João Soares

Cortes

21 de  Novembro  2006

__________

Dr. Mário Soares

Ilustres convidados

Caros amigos

 

 

 

 

Ø Começo por agradecer o amável convite que o Dr. Mário Soares me dirigiu para estar aqui hoje, no décimo aniversário da criação deste lugar de memória.

 

Ø Sensibilizou-me o seu gesto e foi com prazer antecipado que aceitei associar-me até porque a ideia de estar entre amigos vale sempre como um poderoso estímulo;

 

Ø Mais do que reflexões a partilhar convosco, são algumas inquietações que vos trago.

 

Ø Sabem como, desde há muito, me têm preocupado as nossas aparentes dúvidas e hesitações colectivas quanto a assumirmos uma ambição clara de futuro e lhe darmos sentido e conteúdos práticos.

 

Ø “Portugal e os desafios da era global” pareceu-me por isso ser um bom fio condutor para tematizar esta minha inquietação até porque todos sabemos que a complexidade do tempo em que vivemos, e os problemas que continuamente nos põe, exigem mais informação, mais comunicação, mais consciência e maior compreensão.

 

Ø A introduzir o debate, abordarei sucessivamente 3 pontos:

 

o  A era global: o Estado-Nação sob pressão

o  A União Europeia e a globalização

o  Portugal na era global: 4 grandes desafios

 

 

1. A era global: o Estado Nação sob pressão

 

 

Ø Antes de mais, um ponto introdutório, mas da maior importância para marcar o meu ângulo de abordagem do tema que vos trago “Portugal e os desafios da era global”: para mim é claro que os desafios da era global são, sem dúvida, eles próprios, globais, mas também, em simultâneo, eminentemente nacionais.

 

Ø Ao contrário do que possa parecer, nada há de contraditório ou paradoxal nesta afirmação preliminar.

 

Ø Com efeito, é inegável que somos cada vez mais confrontados no dia a dia com problemas que sabemos terem origem em interconexões económicas e sociais, desenhadas no plano transnacional ou mesmo à escala global.

 

Ø Mas também é verdade que um mínimo de esforço analítico nos indica que as soluções encontradas pelos vários países para conviverem com as mudanças globais em curso são muito diversas.

 

Ø E aqui está um primeiro ponto que me parece indispensável realçar neste início de intervenção: embora o peso específico dos factores de ordem internacional que condicionam as economias, as sociedades e as identidades nacionais seja importante – e sou mesmo dos que pensam que é muito importante –, a margem de intervenção política de base nacional continua a ser decisiva para a definição dos níveis e padrões de desenvolvimento dos países e de bem estar das suas populações.

 

Ø Caso contrário, deixaria de haver uma agenda nacional propriamente dita e a democracia mesma deixaria de fazer sentido.

 

Ø Mas é verdade também que os Estados-Nação perderam o monopólio do poder que detinham e nessa medida encontram-se sob uma enorme pressão.

 

Ø Por exemplo, poucos se atreverão, hoje, a pôr em dúvida que a intensificação da concorrência em mercados internacionais abertos coloca às economias e sistemas de emprego nacionais constrangimentos muito fortes.

 

Ø E poucos serão também os que negam que daí decorrem elevados riscos económicos e sociais.

 

Ø No entanto, um mínimo de análise comparativa revela que são muito variáveis, consoante os modelos de desenvolvimento e sistemas de protecção social nacionais, os efeitos dessa hiperconcorrência.

 

Ø Nada melhor para entender esta heterogeneidade de respostas nacionais aos desafios mundiais do que pensar na diversidade de sistemas de protecção social que, sob a designação genérica de “modelo social europeu”, caracteriza o conjunto de países da União Europeia, ou mesmo do núcleo mais restrito da zona euro.

 

Ø Dizem os especialistas que neste espaço económico e social limitado e integrado coexistem pelo menos três modalidades de welfare state, isto é, três tipos distintos de respostas políticas aos desafios de desenvolvimento e de protecção social colocados a sociedades democráticas e de economia aberta de uma região do mundo com níveis de integração económica, política e cultural globalmente elevados.


 

Ø De nenhum modo subscrevo, pois, a ideia, que vem, no entanto, fazendo o seu caminho, de que, no quadro de uma globalização que se intensifica, ao complexo institucional do Estado-Nação fica reservado um papel residual e meramente simbólico no xadrez da governabilidade.

 

Ø Vou mesmo mais longe: a intervenção dos governos e instituições políticas de âmbito nacional tornou-se cada vez mais crucial, embora isto não signifique que o enquadramento não tenha mudado radicalmente, como já referi acima e desenvolverei um pouco a seguir.


 

Ø E porquê? Porque a crescente interpenetração das economias, das culturas e das sociedades, não só torna o sistema de constrangimentos das acções humanas muito mais complexo, como leva a uma multiplicação dos factores de incerteza em matéria de sustentabilidade do desenvolvimento e de efectividade de direitos sociais e de cidadania.

 

Ø A que é que me refiro concretamente?

 

Ø Refiro-me, antes de mais, às dimensões de eficiência económica: sem uma atitude pró-activa e uma visão estratégica amadurecida das instâncias de decisão política de base nacional na criação de condições infra-estruturais de apoio às actividades económico-empresariais, é duvidoso que possam ser garantidos os patamares de produtividade indispensáveis à sua sobrevivência no quadro de competitividade internacional existente.

 

Ø Mas é também por imperativos de solidariedade e de coesão social que se torna indispensável continuar a contar com o papel reformador do Estado-Nação.

 

Ø Julgo, de facto, que os Estados nacionais continuam a ser um espaço privilegiado para combater desigualdades injustas e garantir níveis mínimos de segurança e de direitos à generalidade dos cidadãos

 

Ø E isto independentemente dos avanços que possam realizar-se nesta matéria à escala supra-nacional (e a União Europeia vem caminhando, ainda que timidamente, nessa direcção).

 

Ø Por último, também no plano das identidades nacionais, parecem-me indispensáveis políticas de fomento da diversidade cultural e linguística para contrabalançar a tendência à uniformização fortemente alimentada pela globalização.

 

Ø Por exemplo, no que respeita à diversidade linguística, para além do inglês se ter tornado de facto na língua de comunicação global, políticas fortes de apoio ao bilinguismo ou mesmo plurilinguismo são altamente desejáveis e, neste contexto, a nossa língua tem potencialidades completamente desaproveitadas que deveriam ser desenvolvidas, de resto no quadro de uma estratégia concertada com os restantes países de língua oficial portuguesa.

 

*

 


2.  A União Europeia e a globalização

 

 

Ø Para mim, é óbvio que a União Europeia atravessa actualmente um período de crise – crise de resultados e crise de confiança -, que relaciono, por um lado, com o último alargamento e, por outro, com a globalização.

 

Ø De facto, a União Europeia ainda não se adaptou ao extraordinário processo de mudanças – diria mesmo mutações – que o mundo vive e que marcam a nova Era Global.

 

Ø Como ultrapassar então esta crise, relançar a construção europeia e restaurar a confiança dos cidadãos na EU?

 

Ø É aqui que entra a questão do impasse constitucional.

 

Ø A meu ver, no quadro do Tratado de Nice pode assegurar-se a gestão dos assuntos correntes, podem-se remediar problemas.

 

Ø Mas não é possível encontrar soluções sustentáveis para os inúmeros desafios com que a EU se confronta, a nível económico, a nível social, em termos de segurança e no plano político.

 

Ø  Por isso é urgente pôr termo ao período de reflexão sobre o impasse constitucional que, de resto, até agora nem sequer deu grandes frutos ou pistas.

 

Ø Na semana passada, participei num encontro em Florença do qual resultou um apelo – chamado “Apelo de Florença” – no qual se avançam algumas sugestões para desbloquear a situação.

 

Ø O ponto principal e que importa salientar, é que a solução a encontrar terá de passar, por um lado, pela preservação do acervo contido no actual Tratado Constitucional, já ratificado pela maioria dos Estados e, por outro, pela tomada em consideração das inquietações dos eleitores franceses e neerlandeses.

 

Ø Só para concretizar a forma de resolver esta espécie de quadratura do círculo, seria, por exemplo, aceitável pensar num Protocolo adicional de interpretação das matérias relacionadas com a economia social de mercado, explicitando de que forma a dimensão social deveria ser desenvolvida no quadro de uma economia de mercado regulada.

 

Ø Sublinho este ponto porque entendo que, embora a crise a que me referia há pouco – crise económica e social – se faça sentir sobretudo a nível dos Estados Nação, os problemas em causa – maus resultados económicos, desemprego, desindustrialização – revestem uma dimensão estrutural e global e reflectem por isso preocupantes sinais de vulnerabilidade do modelo de desenvolvimento comum à maior parte dos parceiros da União Europeia.


 

Ø Nesta medida, tratando-se de problemas de natureza global, não há, parece-me, soluções unilaterais nem espaço para atitudes isoladas.

 

Ø Aliás, na nossa Era Global, atitudes nacionalistas ou isoladas são o pior inimigo da Nação e dos seus interesses. Pode parecer um paradoxo, mas não é.

 

Ø Por isso, o primeiro escolho a evitar é o do reflexo proteccionista, de retraimento internacional, e o do impulso de desmantelamento do modelo social europeu.

 

Ø A meu ver, para defender os interesses nacionais importa, que a União Europeia possa, como um todo, sair da crise.

 

Ø É por isso crucial capacitar a EU para tratar dos domínios de actuação nos quais a globalização mais tem tido repercussões – emprego, segurança e protecção social.

 

Ø Ou seja, a reforma do Modelo Social Europeu é uma área chave em que a União Europeia deveria assumir responsabilidades acrescidas.

 

Ø E porque é um ponto chave?

 

Ø Porque o Modelo Social Europeu é um elemento central da identidade do projecto europeu e é um elemento fundamental das nossas sociedades que são por definição inclusivas e cimentadas pela coesão.

 

Ø Ouvimos muitas vezes perguntar se a Europa pode continuar a financiar o seu modelo social; mas, na realidade, devíamo-nos interrogar se a Europa poderá dar-se ao luxo de o dispensar.

 

Ø Pessoalmente, encontro-me entre os que pensam que o modelo social europeu, longe de ser um fardo para a economia europeia, confere-lhe vantagens comparativas.

 

Ø Mas para que assim continue a ser, perante a pressão das novas economias emergentes, é crucial que a Europa invista nas reformas da economia e do modelo social europeu, prosseguindo na linha da Agenda de Lisboa. E é igualmente importante desenvolver programas eficazes de justiça e de bem-estar social. Ora, nesta vertente, há ainda um longo caminho a percorrer.

 

Ø É por isso que a Europa tem de se preparar para a mudança. Para além das reformas económicas, a preocupação com a justiça social tem de ser passar a ser uma prioridade da agenda europeia. Mas para que tal seja possível, precisamos pois de um quadro jurídico-constitucional, de uma renovada vontade política e de uma estratégia clara.

 

 

 

 

 

 


3. Portugal na globalização: 4 grandes desafios

 

 

Ø Tentarei seguidamente aludir de forma breve a alguns traços da sociedade portuguesa que, do meu ponto de vista, continuam a colocar desafios a que importa responder com uma agenda nacional, no quadro natural dos nossos compromissos e responsabilidades europeias e internacionais.

 

Ø Na inventariação dos problemas políticos com que estamos confrontados no espaço e tempo concretos a que podemos chamar Portugal Contemporâneo, quero aqui destacar quatro pontos:

 

o  As questões da Educação/Formação e inovação empresarial

o  A questão da solidariedade e da coesão

o  As assimetrias de desenvolvimento regional

o  Uma política externa forte

 

 


Desafio 1: A necessária articulação entre as questões da Educação/Formação e da inovação empresarial

 

 

Ø Permitam-me que inicie este pequeno inventário, com uma referência ao que considero ser um dos nós fundamentais – talvez o nó fundamental – das nossas dificuldades: a articulação entre as questões da educação/formação, por um lado, e a inovação empresarial, por outro.

 

Ø O grande impulso dado nas últimas décadas à escolarização das novas gerações não pode fazer-nos esquecer outros problemas que, no domínio da educação e da formação, continuam a colocar-se à sociedade portuguesa.

 

 


Ø O primeiro diz respeito aos elevados níveis de insucesso, saída e abandono precoces que têm acompanhado o referido impulso. De acordo com os dados do Eurostat, em 2005, Portugal registava uma taxa de abandono escolar precoce de 38,6% (com taxas mais elevadas para os jovens do sexo masculino) enquanto que em Espanha é de 30,8% em Espanha e a média da Eu se situa nos 15,2%.

 

Ø Sabe-se que tais fenómenos são determinados, em muitos casos, por estratégias familiares de fuga à pobreza (por exemplo, recurso ao trabalho de menores).


 

Ø Noutros casos, insucesso e abandono estão ligados a desfasamentos e incompreensões muito acentuados entre aquisições culturais feitas no meio familiar, por um lado, e padrões culturais privilegiados pela cultura escolar, por outro. A chegada muito tardia do País à generalização da educação de base a toda a população, fazendo com que seja ainda muito baixo o nível de instrução médio das gerações menos jovens, explica em boa parte este desfasamento.

 

Ø Levar a sério a ideia de que os estabelecimentos de ensino são parte fundamental dos serviços públicos de bem estar, que, portanto, devem ser apoiados por todos os outros elos da rede de protecção social dos cidadãos (emprego, cultura, justiça, reinserção social, autarquias), é uma perspectiva que urge aprofundar.  


 

Ø Sem sair da questão educativa, passo a referir-me a um dos mais sérios bloqueamentos com que a sociedade portuguesa se confronta – o da questão da educação e formação de adultos pouco escolarizados, os quais continuam a ser uma parcela muito importante da nossa população activa. Em 2005, somente 4,6% dos adultos portugueses participam em actividades de aprendizagem ao longo da vida, enquanto na UE a taxa de participação é de 11%.

 

Ø Estamos diante de uma dívida do Portugal Democrático para consigo próprio. E se nada fizermos, a curto prazo, para, no mínimo, atenuar a sua amplitude, estou certo de que o futuro nos condenará sem apelo nem agravo.


 

Ø Já foram obtidos, por várias vezes, importantes acordos nesta matéria em sede de concertação social. Por isso, não será aceitável continuar a adiar a concretização de medidas capazes de impulsionar uma melhor articulação entre o sistema regular de ensino e o sub-sistema da formação profissional e de concretizar uma estratégia de formação e de educação ao longo da vida capaz de defender trabalhadores e empresas dos riscos impostos por uma competitividade internacional cada vez mais exigente.

 

Ø Ultimamente, tem vindo a aumentar o número de desempregados com níveis de instrução altos. Pode tratar-se de um fenómeno conjuntural, que a retoma da economia se encarregará de eliminar a curto prazo. Mas também pode constituir manifestação de alguma inadaptação ou resistência do sector empresarial à criação de condições de inserção profissional qualificantes.

 

Ø Ora, sem a necessária valorização, por parte das empresas, das competências transmitidas pelo sistema educativo e de formação, jamais será possível obter taxas de retorno aceitáveis para o investimento em “recursos humanos” realizado no País durante as últimas décadas.

 

Ø Quando se multiplicam os apelos à necessidade de o Estado apoiar a inovação tecnológica e a modernização do tecido empresarial português – e é indispensável e muito positivo que se mantenham -, será justo reconhecer que uma boa parte desse apoio se concretizou já através de investimentos importantes no sistema de ensino.


 

Ø Sem embargo de o esforço público nesta matéria dever prosseguir, espera-se do mundo empresarial que saiba colocar no complexo xadrez da competitividade as suas próprias pedras, aproveitando melhor as qualificações existentes e abrindo-se à requalificação da sua mão de obra. É um risco que, estou certo disso, valerá a pena correr.

 

 

Desafio 2: a questão da solidariedade e da coesão

 

 

Ø No conjunto de indicadores usados em comparações internacionais, e em que, justamente, se assinalam as debilidades do País em matéria de produtividade, é possível encontrar dados que, na perspectiva da repartição da riqueza, nos colocam igualmente em posição desfavorável.

 

Ø Para além de os salários médios serem baixos, verifica-se a existência de elevadas proporções de trabalhadores auferindo salários muito reduzidos.

 

Ø Por outro lado, a distância entre a parcela de rendimento auferida pelos mais ricos e a alcançada pelos mais pobres é, em Portugal, francamente superior à média europeia. Em 2004, o rendimento dos 20% mais ricos era 7,2 vezes superior ao rendimento dos 20% mais pobres; este rácio na UE15 era 4,8 (dados da Eurostat).

 

Ø Não posso deixar de estranhar que, quando se enunciam factores determinantes dos baixos níveis de produtividade do País, se omita tão frequentemente este aspecto.

 

Ø Nessa medida, faço um desafio aos economistas no sentido de esclarecerem os portugueses sobre as implicações económicas do nosso perfil de distribuição de riqueza. Será ele apenas um efeito ou também uma das causas das debilidades do nosso sistema produtivo? 

 

Ø Perante o senso comum e face aos estudos disponíveis, uma coisa parece certa: nas famílias de rendimentos muito baixos, é alta a probabilidade de se gerarem factores de pobreza e exclusão social.

 

Ø Ora, tendo em conta a especificidade da estrutura social portuguesa e a ainda débil consistência do nosso aparelho de protecção social, parece-me indispensável continuar a desenvolver políticas que se destinem a atenuar os efeitos mais penalizadores dessas formas de vulnerabilização.

 

Ø Mas entendo, do mesmo modo, que é necessário actuar a montante com toda a determinação, isto é, através de políticas que os prevejam e previnam, e nomeadamente no núcleo duro das políticas de crescimento económico e de distribuição de rendimentos.


 

Ø Conhece-se a fórmula segundo a qual é necessário compatibilizar, no espaço da União Europeia a que cada vez mais intimamente pertencemos, as exigências da competitividade com as da coesão social.

 

Ø Pois bem: penso que tal fórmula se arrisca a perder conteúdo político efectivo e utilidade prática relevante, se o reduto da distribuição da riqueza a que aqui me referi permanecer imune a reformas que combatam as desigualdades mais evidentes.

 

Ø A meu ver, de facto, no próprio mercado global, as sociedades integradas, coesas e inclusivas – ou seja com um alto grau de justiça social – também apresentam vantagens comparativas no domínio económico. Se dúvidas houvesse, bastaria pensar em casos como o dos países nórdicos.

 


 

Desafio 3: as assimetrias de desenvolvimento regional

 

 

Ø Ainda a este propósito, convém aliás não deixar de aludir a um outro problema não resolvido no Portugal Democrático: o que respeita à persistência de acentuadas assimetrias de desenvolvimento no território nacional.

 

Ø Sabe-se, hoje, que a consagrada dicotomia litoral/interior, continuando embora a expressar em termos globais um velho dualismo que marca negativamente o modelo de desenvolvimento português, já não é inteiramente adequado a dar conta da configuração precisa das referidas assimetrias.


 

Ø Assistiu-se, de facto, nas últimas décadas, à emergência e consolidação de pólos urbanos de média dimensão no interior geográfico do País com o resultado positivo de ter garantido alguma capacidade de inovação e de diversificação das actividades económicas em regiões do País outrora muito confinadas a uma agricultura escassamente modernizada e de baixa produtividade.

 

Ø Mas esta evolução positiva não tem impedido o processo de desvitalização económica e de declínio demográfico de extensas áreas do interior, condicionando o próprio exercício efectivo dos direitos de cidadania por parte das populações do espaço rural profundo.

 

Ø Aliás até o próprio litoral geográfico do País tem gerado no seu seio autênticas e igualmente preocupantes periferias económicas e sociais.

 

Ø Seja em função de tecidos produtivos débeis e pouco diversificados, seja por ausência de acessibilidades condignas, seja por acumulação nas suas populações de problemas de iliteracia e baixas qualificações, seja pela inexistência de um empresariado dinâmico – o certo é que muitos são os espaços locais que se vêem confrontados com autênticos círculos viciosos de subdesenvolvimento.

 

Ø Por mim, não tenho dúvidas em considerar que são grandes as responsabilidades do Estado no combate às desigualdades regionais de desenvolvimento, seja onde for que elas se localizem.


 

Ø Temo contudo que, na ausência de enquadramentos institucionais intermédios entre a administração central e as autarquias, adequados a concretizar no terreno, de forma integrada, as medidas que as circunstâncias exigem, o combate estará perdido ou, pelo menos adiado, para tempo inoportuno, para além de poder levar a desperdícios intoleráveis de recursos nacionais e comunitários.

 

Ø Desenha-se aqui outro problema com que Portugal há muito se confronta, o da descentralização administrativa, que, embora muito importante, não poderei agora desenvolver.

 

 


Desafio 4: Uma política externa forte

 

 

Ø Termino com este ponto algo inusitado neste género de inventários, por ser em geral considerado ora tão consensual que dispensa considerações de maior, ora secundário e por isso de frequente omissão.

 


Ø Ora, na nossa era global, a esfera da afirmação externa do Estados é capital e importa reforçá-la.

 

o  É capital porque os Estados continuam a ser os principais actores da vida internacional e há um número crescente de questões que, sendo de natureza global, são regulados nos quadros do multilateralismo.

 

o  Importa reforçá-la porque, justamente, a internacionalização da economia e de um conjunto significativo de problemas, a consolidação do multilateralismo e o primado do direito internacional impuseram limitações acrescidas à actuação interna dos Estados. Por isso, para reforçar a capacidade e o poder regulador do próprio Estado é imprescindível investir no reforço da sua capacidade internacional, de pesar e de influenciar nas decisões.

 

Ø Para um país como o nosso, com as suas dimensões e posicionamento geo-estratégico, com as responsabilidades resultantes da sua história e com as necessidades derivadas do seu perfil, será determinante apostar numa política externa dinâmica, forte e adaptada às realidades do nosso tempo.

 

Ø Como é bem sabido, com o 25 de Abril operou-se uma mudança profunda na nossa política externa, cujas prioridades se têm mantido constantes.

 

Ø Mais de 30 anos volvidos, importa agora manter a estratégia de política externa afinada pelo diapasão dos novos desafios trazidos pela recomposição da ordem internacional em curso e pela aceleração da globalização.


 

Ø Penso particularmente em cinco aspectos:

 

o  num multilateralismo pró-activo, empenhado na reforma do sistema de relações internacionais, na formulação da sua agenda e na resolução dos problemas de acordo com os princípios da legalidade da ordem internacional;

o  numa participação de primeira linha na União Europeia; num relacionamento bilateral destinado a potenciar a nossa actuação no seio da União Europeia;

o  num relacionamento bilateral empenhado nas acções de promoção e de sustentação das exportações portuguesas e dos investimentos de exterior em Portugal e de Portugal no exterior;

o  na promoção do português como língua global e das culturas lusófonas na sua diversidade.

 


 

Meus amigos

 

Ø A afirmação de um país não se mede só em função da dimensão do território ou do PIB, mas da sua capacidade de se afirmar como parceiro credível, empenhado em contribuir efectivamente e activamente para a resolução dos problemas e para o desenvolvimento de políticas  inovadoras.

 

Ø Para a afirmação externa de Portugal e dos nossos interesses, é fundamental envidar todos os esforços para nos mantermos no “pelotão da frente” e melhorar a nossa imagem. É preciso que o nome de Portugal acrescente valor, que possa ser associado a atitude cooperativa, a participação empenhada, a qualidade e a modernidade.


 

Ø Tal estratégia não pode resumir-se contudo a uma operação de marketing para o exterior. É um processo mais fundo, que nós próprios, como portugueses, temos de assumir e de realizar.

 

Ø Desde logo transformando a visão pouco positiva que muitas vezes temos de nós próprios, assumindo uma atitude mais afirmativa, empreendedora e valorizante.

 

 

 

 

 

Muito obrigada pela vossa atenção.